02/06/10

Quatro poemas de Ferreira Gullar

O Prémio Camões 2010 foi atribuído ao poeta brasileiro Ferreira Gullar (nascido em 1930), distinguindo uma carreira literária iniciada em 1949 com «Um pouco acima do chão».
Em Portugal, a sua obra poética foi editada pelas edições Quasi.

MEU POVO, MEU POEMA
meu povo e meu poema crescem juntos
como cresce no fruto
a árvore nova
No povo meu poema vai nascendo
como no canavial
nasce verde o açúcar
No povo meu poema está maduro
como o sol
na garganta do futuro
Meu povo em meu poema
se reflete
como a espiga se funde em terra fértil
Ao povo seu poema aqui devolvo
menos como quem canta
do que planta

DOIS E DOIS: QUATRO
Como dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
embora o pão seja caro
e a liberdade pequena
Como teus olhos são claros
e a tua pele, morena
como é azul o oceano
e a lagoa, serena
como um tempo de alegria
por trás do terror me acena
e a noite carrega o dia
no seu colo de açucena
- sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
ea liberdade, pequena.

BARULHO
Todo o poema é feito de ar
apenas:
a mão do poeta
não rasga a madeira
não fere
o metal
a pedra
não tinge de azul
os dedos
quando escreve manhã
ou brisa
ou blusa
de mulher.
O poema
é sem matéria palpável
tudo
o que há nele
é barulho
quando rumoreja
ao sopro da leitura.

THAT IS THE QUESTION
Dois e dois são quatro.
Nasci cresci
para me converter em retrato?
em fonema? em morfema?
Aceito
ou detono o poema?

1 comentário:

Graciete Rietsch disse...

Já sabia que o prémio Camões foi atribuído ao poeta Ferreira Gullar
e achei muito lindos os poemas que o Eduardo escolheu para o seu "post".

Um beijo.