Finalmente encontrei um livro com um poema que procurava há anos.
O poema chama-se «Port-Wine», fazia parte dum disco de Mário Viegas e o autor é Joaquim Namorado.
O livro, que adquiri num alfarrabista do Porto, chama-se «Poesia Necessária».
O Douro é um rio de vinho que tem a foz em Liverpoool e em Londres e em Nova-York e no Rio e em Buenos Aires quando chega ao mar vai nos navios, cria seus lodos em garrafeiras velhas, desemboca nos clubes e nos bars.
O Douro é um rio de barcos onde remam os barqueiros suas desgraças. primeiro se afundam em terra as suas vidas que no rio se enterram as barcaças.
Nas sobremesas finas as garrafas assemelham cristais cheios de rubis, em Cape-Town, em Sidney, em Paris, tem um sabor generoso e fino o sangue que dos cais exportamos em barris.
As margens do Douro são penedos fecundados de sangue e amarguras onde cava meu o povo as vinhas como quem abre as próprias sepulturas: nos entrepostos do cais, em armezéns, comerciantes trocam por esterlino o vinho que é o sangue dos seus corpos, moeda pobre que são os seus destinos.
Em Londres os lords e em Paris os snobs, no Cabo e no Rio os fazendeiros ricos acham no Porto um sabor divino, mas a nós só nos sabe, só nos sabe, à tristeza infinita de um destino.
O rio Douro é um rio de sangue, por onde o sangue do meu povo corre. Meu povo, liberta-te, liberta-te!, Liberta-te, meu povo! - ou morre. | |
Joaquim Namorado
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